Crise financeira na Santa Casa de Angra está longe do fim

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Os desafios financeiros e de gestão da Santa Casa de Misericórdia de Angra estão longe do fim. Desde janeiro o hospital voltou a ser administrado integralmente pela Irmandade da Santa Misericórdia, com o fim da intervenção iniciada em 2012. Os cinco anos de gestão municipal porém, deixaram de legado uma dívida de R$ 41 milhões que a Irmandade não consegue pagar. Samuel Almeida, o atual provedor, explica que sem o apoio dos cofres municipais, a Santa Casa não tem como manter-se.

— O que a prefeitura nos repassa é a nossa garantia de funcionamento. Sem isso não há como manter abertos os atendimentos — explica ele.

A intervenção na Santa Casa foi ideia do prefeito Essiomar Gomes (PP), em janeiro de 2012, durante um período de interinidade. Essiomar justificou o ato como estratégia para sanar as dívidas da unidade. Porém, o que somava R$ 14 milhões no final de 2011 saltou para R$ 41 milhões em 2016. Até o Ministério Público quer saber a origem da dívida, que inclui R$ 17 milhões de natureza tributária, de retenções feitas aos funcionários, como seguridade social e Imposto de Renda, não repassados ao Fisco. A apuração deste crime pode gerar sanções aos ex-administradores do hospital e da prefeitura. Segundo Samuel, esta dívida não é da Irmandade e deveria ser assumida por quem geriu o hospital até 2016, ou seja, a prefeitura.

— Por isso nós pedimos que seja feita uma auditoria. Que se avalie tudo o que foi contratado e a responsabilidade. No nosso entendimento, a dívida é do município — acredita.

Compras — Além das dívidas com impostos, já negociadas segundo Samuel, desde a abertura do Hospital Geral da Japuíba (HGJ), em 2014, servi- ços, pessoal e insumos foram trocados entre as duas unidades. Tanto a Santa Casa realizava procedimentos e cirurgias no HGJ e recebia por eles, via Sistema Único de Saúde, quanto o HGJ dependia de compras feitas pela Santa Casa para abastecimento e manutenção. Este cordão umbilical foi cortado em janeiro deste ano, por decisão do prefeito Fernando Jordão, ao instituir a Fundação Hospital Geral da Japuíba. Agora os dois hospitais são autônomos. O impasse, porém, é resolver o passivo do período dessa cogestão.

Maternidade — Se o município de Angra insistir na abertura da nova maternidade no HGJ, a Santa Casa vai fechar as portas. Hoje a maternidade é a principal fonte de renda própria da Santa Casa, além do repasse mensal de R$ 1,6 milhão do governo municipal, que não está atrasado. A solução defendida quando da abertura do Hospital da Japuíba é que os serviços de maternidade seriam concentrados na Santa Casa, que já realiza 300 partos por mês e nos últimos dois anos não teve sequer um caso de morte materna ou do bebê. Samuel admite que a folha de pagamentos do hospital, em torno de R$ 1 milhão mensais, está alta e que será necessário fazer cortes. Desde janeiro, pelo menos 70 pessoas já foram demitidas, o que também gera custos.

— Não se trata apenas de demitir. Em muitos casos, nos falta dinheiro até para as indenizações. Vamos diminuindo à medida que dá — conta ele.

Samuel espera que nas próximas semanas, o governo municipal proponha a repactuação das relações com a prefeitura. Ele propõe uma mediação do Ministério Público, tendo em vista que a Santa Casa tem todas as licenças do Ministério da Saúde para a maternidade e que sua filantropia (ou seja, a redução dos impostos que paga) depende de atendimento mínimo de 60% de clientes SUS. Sem a maternidade, o risco de perder a filantropia é grande e o hospital tornaria-se inviável, desempregando de imediato, mais de 400 pessoas.

Família — A tarefa de dirigir a Santa Casa não é remunerada. Ao contrário, acaba gerando despesas pessoais para o provedor. Samuel exerce a provedoria pela segunda vez por influência do pai que, na década de 50 acabou pedindo-lhe que ajudasse a Santa Casa. Antes do pai, o tataravô de Samuel, comendador José Félix de Almeida, também havia sido provedor do hospital no final do século XIX.

— Não tive como negar o pedido, quase uma ordem, do meu pai. Continuarei servindo aqui enquanto puder — revelou Samuel Almeida.

Esta matéria foi publicada antes na edição impressa do Tribuna Livre.

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