Os mais de 70 candidatos que disputam a eleição para o Conselho Tutelar em Angra dos Reis foram surpreendidos na manhã desta quarta-feira, 12, com uma decisão aparentemente monocrática da comissão que organiza a escolha pública, de restringir a apenas dois locais as urnas para votação no dia 6 de outubro. Mais tarde a prefeitura tentou justificar a mudança informando que, ao contrário do que ocorreu em todas as escolhas do Conselho nos últimos anos, desta vez teria sido a Justiça Eleitoral quem negou à prefeitura o acesso aos dados dos eleitores. Sem isso, argumenta o governo municipal, haveria risco de fraudes.

— As informações do cadastro seriam necessárias para impedir que um eleitor, em uma mesma zona eleitoral, votasse mais de uma vez, em diferentes seções, já que cada seção teria uma lista de eleitores por ordem alfabética. Ao comparecer em sua seção, não haveria como o eleitor votar em outra — justifica a prefeitura.

Só que a solução encontrada pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente (CMDCA) desagradou à imensa maioria dos eleitores e até aos candidatos. Os dois locais apontados para a votação são as sedes da 116ª e da 147ª zonas eleitorais na cidade: respectivamente o Centro e o Parque Mambucaba. Neste arranjo, quem mora desde a Sapinhatuba III até o Frade teria de votar em Mambucaba, e quem mora desde a Mombaça até a Garatucaia (na divisa com Mangaratiba), votará no Centro da cidade. Para alguns candidatos, esta decisão restringe o direito de participação dos eleitores num pleito que já não é obrigatório. Para se ter uma ideia, desde a Garatucaia até o Centro, por exemplo, são quase 40km de distância.

— Não tem condições. É desanimador. Sabemos que as pessoas não vão deixar seus afazeres num domingo, pagar passagem e perder quase a metade do dia para ir votar. A decisão desincentiva a participação — reclama um dos candidatos a conselheiro ouvidos pelo Tribuna Livre.

Em sua justificativa, a prefeitura prossegue dizendo que esta alteração teria tido o aceite dos demais organismos de vigilância do processo eleitoral, inclusive do próprio Ministério Público, e que a não divulgação dos dados de eleitores por parte do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) não foi exclusiva de Angra dos Reis.

A negativa do TRE estende-se a todo o Estado. Para o órgão, informar nome completo e endereço dos eleitores seria ofensivo à privacidade. Mesmo com as inúmeras tentativas da Comissão, a Justiça Eleitoral manteve-se irredutível. A única informação disponibilizada pelo TRE foi o nome dos eleitores por zona eleitoral, o que obrigou a comissão de acompanhamento e o Ministério Público a disponibilizarem apenas dois locais de votação, um em cada zona eleitoral do município — diz a nota do governo municipal.

Além de criar obvias dificuldades de acesso de parte da população aos locais de votação, moradores da Ilha Grande também serão privados da participação efetiva na disputa já que não haverá votação na área insular do município. Para alguns candidatos, a decisão, se não for revertida, transformaria a eleição numa disputa de ‘cartas marcadas’ em que os candidatos do Quarto Distrito e da região central serão amplamente favorecidos pela proximidade de seus eleitores aos locais de votação e terão, portanto, mais chances de obter as maiores votações, algo que fere a isonomia (*) da disputa. A gritaria é geral.

Isonomia significa igualdade de todos perante a lei. Refere-se ao princípio da igualdade previsto no art. 5º da Constituição Federal, segundo o qual todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza.

— Desagradou a todos. Nos pareceu que a comissão optou pela solução mais simples, sem sequer argumentar com a Justiça Eleitoral a respeito da geografia dos bairros da cidade. Foi uma solução ruim para a disputa — avaliou uma das candidatas a conselheira.

Os locais de votação serão o Colégio Estadual Artur Vargas (Ceav), na rua Coronel Carvalho, 230, no Centro; e o CIEP Alberto da Veiga Guignard, na rua Aviador Santos Dumont, 552, no Parque Mambucaba. A prefeitura de Angra informa que estuda meios de amenizar o prejuízo aos candidatos e possibilitar a locomoção dos eleitores.

Política — Os mais revoltados com a medida prometem não abandonar a causa. Uma ação judicial pode ser apresentada contra a decisão do CMDCA. Ontem mesmo, 11, um grupo teve reunião na sede da subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Angra (foto) para discutir o assunto. Os vereadores da Câmara Municipal também seriam mobilizados para ‘comprar a briga’ e apoiar uma alteração nas condições de votação.

Além da questão relacionada ao local da votação, corre em paralelo outra polêmica, mais velada: a interferência explícita de vereadores em favor de ‘seus preferidos’ na disputa. Há casos de assessores parlamentares que venceram as etapas de seleção e estão entre os candidatos. Nestes casos, apesar de não haver ilegalidade, há também um nítido desequilíbrio na disputa em desfavor daqueles que ‘não têm’ padrinhos. Dos 14 vereadores de Angra dos Reis pelo menos doze têm candidatos declarados ao Conselho e atuam como uma espécie de coordenadores informais das candidaturas. A votação de um conselheiro, no cenário em que havia votação em toda a cidade, é considerada por alguns como uma espécie de ‘prévia’ da disputa eleitoral para vereador marcada para 2020.

Fotos: Arquivo/2014/PMAR + Reprodução

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