Mesmo enfrentando ainda um período de muito risco e instabilidade num setor que foi praticamente exterminado no país a partir de 2015, as palavras da presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Angra dos Reis, Cristiane Marcolino, já indicam uma mudança de humor para a categoria. A situação, por incrível que pareça, está melhorando, ela percebe.

— Nós hoje estamos vendo alguma melhora, ainda pouca, mas com bastante esperança de dias melhores. Precisamos continuar na luta e em defesa sempre do conteúdo nacional nas obras da Petrobras especialmente — avalia a dirigente sindical, a primeira mulher a dirigir o sindicato mais importante da Costa Verde fluminense.

Na semana passada, Cristiane (foto) e os demais líderes do sindicato conduziram a negociação salarial anual da categoria conquistando reajuste de 5,07% nos salários e mais 5,0% no vale-alimentação. Além disso conquistaram um compromisso da direção do estaleiro em rever a situação de mais de 150 profissionais que estão empregados como ‘ajudantes’ há mais de 10 anos, sem perspectivas de promoção. Segundo Cristiane, estes casos serão avaliados de forma individual pela empresa e resultarão, em sua maioria, em melhorias salariais para estes trabalhadores.

Em alguns momentos da negociação com a empresa, diz ela, foi preciso ‘endurecer’. Mesmo contra a posição de muitos trabalhadores que queriam uma negociação mais dócil com a Keppel Fels, a controladora do estaleiro de Jacuecanga. Isso em geral por medo do desemprego e de retaliações. O estaleiro de Angra dos Reis é praticamente o único em operação no Brasil e segundo a dirigente sindical, não há risco de a empresa asiática fechar o seu parque industrial. Para Cristiane, as notícias no setor parecem indicar que ‘o pior já passou’.

— A luta tem que ser travada diariamente.  Não tem descanso. Não há, por exemplo, nenhuma sinalização do governo federal ainda a respeito da garantia de conteúdo nacional nas obras e isso é preocupante. No segundo semestre vamos relançar a Frente Parlamentar de Defesa do Setor Naval e provocar ainda mais este debate em nível nacional — avisa ela.

Durante a campanha eleitoral, o presidente Bolsonaro (PSL) não assumiu compromisso com o índice de conteúdo nacional. O presidente chamava de ‘burocrática’ a exigência de conteúdo local pois ela reduziria a produtividade e a eficiência das empresas brasileiras. Como solução ele propôs o fim gradual desta proteção à indústria brasileira para que, segundo ele, as empresas nacionais cresçam e modernizem-se. Este item do plano de Bolsonaro foi destacado pelo Tribuna Livre aqui durante a campanha eleitoral.

Atualmente, o estaleiro Keppel Fels tem cerca de 1,7 mil trabalhadores. Cristiane disse serem falsas as notícias sobre a contratação deste número de pessoas na empresa. Nas últimas semanas, ela diz, houve quase 200 contratações, todas de caráter temporário. Ela também receia que o anúncio de construção de plataformas no Brasil não gere o número de empregos esperado caso não haja obras em estaleiros brasileiros.

— Quando o governo federal diz que fará 20 plataformas esquece de dizer que sete delas terão conteúdo nacional perto de zero e que outras dez terão apenas 25% de conteúdo brasileiro, o que é muito pouco. Para se ter uma ideia, para retomarmos o nível de empregos que tínhamos em 2011, por exemplo, seria preciso que todas as plataformas fossem feitas no Brasil e não há esta garantia — explica a dirigente.

Sete Brasil — Uma das expectativas mais próxima dos trabalhadores é a que seja concluída nos próximos meses uma negociação com a empresa Sete Brasil para a conclusão de duas sondas que estão no estaleiro. Uma delas com mais de 90% concluída. Estes contratos representariam cerca de 1,0 mil empregos a mais. O estaleiro ainda disputa uma obra da empresa SBM Offshore e outra do grupo Modec. Em ambos os casos, o estaleiro leva uma certa vantagem por ser o único em atividade semiplena. Outra esperança está no anúncio ainda não confirmado pela Petrobras de que a estatal planeja oferecer ao mercado a possibilidade de que empresas privadas possam construir as plataformas e depois afretá-las à estatal, sem a liberação de dinheiro imediato. Se isso acontecer, diz Cristiane, o estaleiro angrense teria interesse, ela garante.

— Ainda é preciso cautela neste momento. Creio que uma retomada maior de empregos aqui só se dará a partir de 2021, o que é ainda muito dependente do posicionamento da Petrobras. Mesmo assim notamos que a situação está melhorando e temos esperança — finaliza ela.

Reportagem: Klauber Valente (da Redação) /  Fotos: Divulgação

Publicado antes na edição impressa do Tribuna Livre (Edição 255).

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