Prestes a ser suspenso por prazo indeterminado pelo prefeito de Angra dos Reis, Fernando Jordão (PMDB), o programa de passagens subsidiadas Passageiro Cidadão jamais deveria ter sido criado da forma como foi. Esta avaliação foi a tônica de todo o governo da ex-prefeita Conceição Rabha (2013-16) que, ao menos, tentou corrigir distorções na ideia. Ao longo de quase 5 anos de duração, o Passageiro Cidadão foi um foco de polêmicas e um escoadouro de recursos públicos, como se verá a seguir:
Início: um programa para eleger prefeito
Veio 2012 e o ex-prefeito Tuca desistiu da reeleição. Com um grave problema de saúde, desistiu também de comandar seu principal programa social, chamado por seus apoiadores de programa de transferência de renda. Sobrou para os dois candidatos à prefeitura, a tarefa de desdobrarem-se para defender a ideia. Como Tuca era afilhado político de Fernando Jordão, parecia obvio que se vencesse, o então candidato manteria a iniciativa. Já a ex-vereadora Conceição Rabha (PT) foi acusada de querer acabar com o projeto. Sofreu e a duras penas acabou convencendo a população de que o programa seria mantido. Conceição venceu a eleição e, em 2013, o Passageiro Cidadão teve seu primeiro revés.
Ajuste: o povo descobre que o Passageiro Cidadão sai do seu bolso
A revisão dos critérios foi um ‘pega para capar’, como se diz. A primeira ideia da equipe da ex-prefeita era limitar o benefício apenas aos credenciados do Bolsa Família. A oposição não aceitou. Conceição também queria limitar a contrapartida da prefeitura, aumentando o investimento do cidadão. Como a passagem deixaria de custar R$ 1,00, a oposição não aceitou a princípio. Após duas semanas de indefinição e muitos protestos, xingamentos e mensagens de ódio na redes sociais, a Câmara aprovou a revisão da lei de Tuca. Agora o Passageiro Cidadão passava a ter critérios, como o limite de duas passagens, a retirada da linha expressa (mais cara) do programa e a exigência de que o benefício fosse exclusivo para moradores de Angra. Aumentou também o investimento do cidadão e a passagem deixou de custar R$ 1,00. Na quinzena posterior à entrada em vigor das novas regras, a despesa com o programa caíra pela metade e, em um ano, a economia já ultrapassara os R$ 10 milhões.
Incoerência: a morte anunciada do programa
Na campanha de 2016, o Passageiro Cidadão não foi polêmica. Como Fernando Jordão foi um candidato quase único todo o tempo, não foi exigido a ele assumir nenhum compromisso com o projeto. Esperto, ele também nada disse a respeito, embora soubesse da fragilidade financeira em que está o município.
Nesta terça-feira, 10, Fernando Jordão decretou, enfim, a morte anunciada do Passageiro Cidadão. Ele tem agora R$ 9 milhões em dívidas e prevê que faltará dinheiro, no fim de 2017, para honrar os compromissos de seu próprio governo. Como tem maioria sólida na Câmara, não terá dificuldades em aprovar as medidas. Eleito com mais de 80% dos votos também tem ‘gorduras para queimar’ em matéria de popularidade. Se está certo ou errado, o tempo dirá.
Efeitos: mais pressão sobre o sistema de transporte
As repercussões da suspensão do Passageiro Cidadão são muitas. Este é um corte que atinge, sobretudo, a população mais pobre, que é a maioria entre os usuários de transporte coletivo. Os mais prejudicados são os moradores da Japuíba que, por causa da quilometragem percorrida, são os que pagam a passagem proporcionalmente mais cara. Perdem também os moradores de linhas deficitárias, ou seja, linhas que não se pagam, como é o caso de Serra D’Água, Banqueta, Caputera e Camorim. Nestes casos, pode haver ainda mais diminuição de passageiros e consequente redução de horários.
Há um prejuízo em potencial para o setor do comércio e de serviços. Nos últimos anos, grande parte dos pequenos comerciantes migrou (de forma indevida) para o Passageiro Cidadão em detrimento do vale-transporte regular. O motivo, muito simples, é que é mais barato complementar a passagem menor que o valor integral. Sem o Passageiro Cidadão, as empresas têm que voltar ao vale-transporte, que é mais caro. Resultado: podem haver demissões ou seleção de profissionais que residam mais perto dos locais de trabalho.
A mudança terá também um componente eleitoral, claro. Será usada pelo que restou da oposição e pode arranhar a integridade de vereadores e do próprio prefeito. Para poupar-lhes na Câmara, Fernando assumiu toda a responsabilidade. Políticos ouvidos pelo Tribuna Livre apostam que a suspensão não deve durar até março do ano que vem quando, não por acaso, há eleição para deputados estaduais e federais. A conferir.
De qualquer forma, o fato é que o Passageiro Cidadão é uma irresponsabilidade financeira desde o início e agora, aqueles que no passado criticavam a ex-prefeita pela defesa da necessidade de controle sobre o benefício, estão às voltas com a obrigação de defender sua suspensão total. E vida que segue.
Notas:
– Na próxima edição impressa do Tribuna Livre, reportagem completa sobre a suspensão do Passageiro Cidadão.
– Em nosso site, tem uma enquete para medir a opinião do povo sobre a suspensão do benefício. Vote e compartilhe.
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