Fazer do momento de dor e tristeza, uma chance de salvar vidas. Transformar um ato violento num gesto de amor a um desconhecido. Foram as decisões de uma família de Paraty que aceitou doar os órgãos de um jovem de 23 anos morto em mais um atentado na cidade. Esta foi a primeira vez que a saúde pública de Paraty fez a captação de órgãos para doação.
A história triste com final de esperança começou no sábado, 28 de abril, de madrugada, quando o jovem deu entrada na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da cidade com ferimento a bala na cabeça. O estado do rapaz já era gravíssimo, segundo a equipe médica. Na manhã do dia seguinte já foi visto o quadro de morte encefálica, dando início então ao complicado trabalho de captação de órgãos, como detalha o atual diretor-médico da UPA, Dr. Alexandre Sales, ortopedista que há cinco anos atende em Paraty.
— Os procedimentos para a doação de órgãos são muito rigorosos. Tanto que o ateste da morte encefálica nem é feito por profissionais locais. Uma equipe do Programa Estadual de Transplantes (PET) vem do Rio de Janeiro para esse procedimento e então faz a abordagem à família para explicar que aquele paciente é um doador em potencial. Tudo é feito com muito rigor mas também rapidez pois o quadro de morte encefálica pode evoluir para morte e tornar o transplante inviável — explicou o médico.
Sales também conta que o profissional de Saúde que está no atendimento é um importante elo nessa corrente do bem. Cabe a ele a primeira identificação de saber se aquele paciente pode evoluir para um quadro de doação de órgãos. Informação, neste caso, é fundamental para esta avaliação inicial.
Só na segunda-feira, 30, após a decisão da família começaram os procedimentos visando os transplantes. O diretor da UPA de Paraty conta que neste período, o paciente doador é monitorado o tempo todo e são feitos procedimentos vi-sando a manutenção da vida. Enquanto isso, familiares e a própria equipe de Saúde preenchem formulários e fazem os preparativos para o transporte dos órgãos doados.
— É preciso agradecer muito a esta família. Pelo gesto de bondade e amor, mas também pela paciência em esperar que estes procedimentos fossem feitos com a calma que exigem. Num momento de dor extrema, revelaram grande solidariedade — diz o doutor Alexandre.
Para a equipe médica de Paraty, ele diz, o sentimento também foi de satisfação por terem participado da experiência. Em geral, uma equipe medica do próprio Estado é quem faz as cirurgias de extração dos órgãos doados. Alexandre Sales crê que o procedimento feito em Paraty revela também a eficiência da UPA em atendimentos de média e até alta complexidade.
— Estamos sempre melhorando. Há cinco anos quando eu cheguei não tinha médico especialista e havia apenas um ou dois médicos na verdade para tudo. Então é visível que já houve uma melhora muito importante e devemos sempre buscar melhorar — diz ele.
Destino — Os familiares do jovem doador não sabem o destino dos órgãos, que seguiram para uma grande fila de espera administrada pelo Sistema Único de Saúde (SUS), que tem o maior programa público de transplantes do mundo, no qual cerca de 87% dos transplantes de órgãos são feitos com recursos públicos. É certo, como acredita o médico, que neste momento, estes órgãos já estão em outras pessoas, dando-lhes uma segunda chance de viver ou de ter qualidade de vida.
Angra — Em Angra dos Reis, a captação de órgãos para transplante já acontece desde 2014, logo após a abertura do Hospital Geral da Japuíba. Pelo menos quatro procedimentos já foram feitos desde então.
Estado do Rio bate recordes em captação de órgãos este ano
Segundo a secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro, o Programa Estadual de Transplantes começou 2018 com aumento no número de doações de órgãos. Além de conquistar o maior número de transplantes de órgãos e córneas realizados no primeiro mês do ano em toda sua história, o programa alcançou em fevereiro o dobro de transplantes de coração em comparação ao mesmo mês do ano passado. Os transplantes de córnea cresceram com 42%. Um dos principais desafios ainda é diminuir o índice de negativa familiar, que no Rio de Janeiro é de cerca de 30%. Apenas no ano passado, mais de 230 órgãos deixaram de ser doados por decisões de familiares.
— Avançamos muito quando o assunto é doação de órgãos. Isso é resultado do trabalho da equipe do PET, que é incansável e absolutamente dedicada e da solidariedade das famílias que decidem fazer o bem num momento de muita dor. Precisamos manter o debate sobre o assunto para que a negativa dos familiares seja cada vez menor — enfatiza o ex-secretário de Estado de Saúde do Rio, Luiz Antonio Teixeira Junior.
Doação – Qualquer pessoa saudável pode ser doador de órgãos. Mas deve comunicar isso à sua família para que a mesma saiba como agir em casos desta natureza. Para saber mais sobre o tema e conhecer experiências de transplantes bem sucedidos, a secretaria de Saúde do Estado desenvolveu o site doemaisvida.com.br. Acesse e compartilhe.
Fotos: Reprodução
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Publicado antes na edição 212 do jornal Tribuna Livre.
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