Angra dos Reis abriga duas usinas nucleares em funcionamento | Foto: Divulgação

As usinas nucleares Angra 1 e Angra 2 correm o risco de paralisarem suas atividades de geração de energia antes do final do ano que vem. Pelo menos é o que indicam documentos trocados entre a Eletronuclear, o Ministério das Minas e Energia e as Indústrias Nucleares do Brasil (INB) aos quais o Tribuna Livre teve acesso. Esta troca de correspondências deixa claro que, se não houver mudanças no financiamento do setor, sobretudo em relação ao orçamento da INB, as usinas de Angra não terão condições de continuar fornecendo energia ao sistema elétrico nacional. E a data deste colapso já está inclusive marcada: novembro de 2018.

Pelos relatos, a causa principal deste apagão são os cortes de orçamento que vêm sendo feitos pelo governo do presidente Michel Temer (PMDB) na área de Ciência e Tecnologia e no próprio setor de energia. Um pouco em função disso, a Eletronuclear, que costumava adiantar os pagamentos à INB, neste momento acumula dívidas com a fábrica em Resende, onde se beneficia o urânio que é usado como combustível das usinas em funcionamento.

Em Nota Técnica produzida pela Eletronuclear a respeito do problema, a empresa admite que, desde 2014, após uma forte desvalorização do real, vem rolando dívidas com a INB e que, diferente do que fora planejado no ano passado, em 2017 provavelmente não conseguirá sanar o débito, que deverá fechar o exercício perto de R$ 50 milhões. Com isso, as entregas de combustível para Angra 2 em outubro de 2018 e para Angra 1 em fevereiro de 2019, podem não ocorrer. Caso isso ocorra, o Operador Nacional do Sistema elétrico (ONS) já fez as contas e calculou o impacto da saída das usinas de Angra do sistema. A questão é tratada de forma dramática.

— As unidades de Angra têm papel fundamental no atendimento eletroenergético ao subsistema Sudeste/Centro Oeste. Caso (…) não estejam disponíveis será necessário despacho térmico em torno de 400 MW na área do Rio de Janeiro — diz um trecho de um ofício encaminhado pelo diretor do ONS, Luiz Eduardo Barata, ao secretário de Energia Elétrica do Ministério de Minas e Energia, Wilson Grütner.

Cortes no orçamento — O funcionamento pleno das usinas de Angra depende do combustível nuclear que é produzido pela INB. Já há alguns meses a empresa está impossibilitada de fazer a produção e o combustível que abastece os reatores da unidade voltou a ser importado. A crise atual preocupa o setor e pode comprometer até mesmo o desenvolvimento do ambicioso projeto nuclear brasileiro que inclui, além de Angra 3, a conclusão do primeiro submarino nuclear brasileiro, hoje em construção no estaleiro da Nuclep, em Itaguaí. Em debate recente na Conferência Internacional do Atlântico Nuclear, em Belo Horizonte (MG), o tema foi trazido a público pela primeira vez pelo presidente da INB, Reinaldo Gonzaga. Ele confirmou que a empresa não entregará a carga de combustível para Angra 2 se forem mantidos os cortes no seu orçamento. A empresa já não está mais beneficiando o próprio urânio e sim importando, apesar de o Brasil deter uma das maiores reservas do minério no mundo.

O presidente interino da Eletronuclear, Leonam Guimarães, que também estava no encontro na capital mineira, teria admitido o problema. E reclamado que os custos financeiros cobrados pelos bancos à empresa pelos sucessivos financiamentos para construir a usina Angra 3 podem atrapalhar o desenvolvimento da empresa nos próximos anos.

Uma solução tanto para o financiamento da INB e da própria Eletronuclear está sendo tentada em Brasília, com mudanças no Orçamento Geral da União. A Eletronuclear está endividada por causa do financiamento de Angra 3, cujos juros do empréstimo de R$ 3,6 bilhões começaram a ser cobrados em outubro.

Há pelo menos 15 dias, o Tribuna Livre tenta ouvir um posicionamento da empresa sobre a questão. O jornal enviou perguntas por e-mail e tentou contatos telefônicos sem sucesso até o fechamento da última edição impressa (14/11).

INB e Eletronuclear buscam apoio político de Rodrigo Maia para enfrentar a crise

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), recebeu na semana passada (foto), dirigentes da Eletronuclear e da INB e ouviu sobre as dificuldades financeiras que as duas empresas estão enfrentando este ano. O principal problema levantado por ambas são os cortes no orçamento da INB, o que inviabiliza a produção plena de combustível nuclear para as usinas de Angra. A consequência disso seria a parada obrigatória das operações das usinas Angra 1 e Angra 2, possivelmente no final de 2018.

No caso da Eletronuclear, o presidente Leonam Guimarães argumentou que, com a paralisação das obras de Angra 3 e a queda na cotação do real frente ao dólar, a estatal passou a sofrer um desequilíbrio econômico-financeiro que beira o ‘insuportável’. A Eletronuclear quer que seja suspensa o cobrança dos juros dos empréstimos feitos junto ao banco BNDES para a construção de Angra 3, além da revisão na tarifa da venda da energia produzida em Angra. O caso deverá ser tratado pelo Ministério de Minas e Energia e, no caso da INB, na comissão de orçamento do Senado.

Fotos: Reprodução

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Publicado antes na edição 197 do jornal Tribuna Livre.

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